segunda-feira, 25 de março de 2013


TOLERÂNCIA, CONVIVÊNCIA E CONFLITOS RELIGIOSOS
Valdemar W. Setzer
21.11.12
 A convivência exige algo mais do que tolerância ativa?
Um ingrediente fundamental na convivência duradoura é a confiança. Uma pessoa tem confiança em outra quando pode contar com as suas atitudes. Uma das maneiras de uma pessoa eventualmente desenvolver confiança em outra é esta ter um genuíno interesse pela primeira, chegando mesmo a colocá-lo acima de seus interesses pessoais, e age segundo o que a primeira espera. A confiança pode ocorrer em apenas uma área de interesse, e não em outras. É possível ter confiança nas ideias de outra pessoa, inclusive desconhecida; para isso, é necessário que essas ideias sejam coerentes e estejam de acordo com a visão de mundo de quem confia.
 
Sentimentos mudam. Portanto, uma convivência baseada exclusivamente em sentimentos provavelmente não perdurará por muito tempo. Além da tolerância ativa e da confiança, é preciso haver um outro ingrediente: a existência de ideais comuns universais. Por exemplo, se um casal tem filhos, a sua educação, principalmente se seguir princípios pedagógicos bem definidos, pode servir como esse ideal. No entanto, nesse caso, quando os filhos crescerem, ficarem independentes e talvez forem embora, não sobrará aquilo que unia o casal. Hoje em dia, para que um relacionamento entre um casal seja duradouro, é preciso que se desenvolvam interesses e ideais comuns. Além disso, é preciso criar um espírito único do casal, de modo que cada membro não possa sequer imaginar como seria a vida com outro parceiro. Tudo isso exige hoje em dia um trabalho muito consciente. Já se passou a era em que essas atitudes eram conseguidas intuitivamente. Hoje é preciso fazer um esforço para se manter um relacionamento. Obviamente, sentimentos de amor ou carinho são ingredientes fundamentais, mas se não houver algo que os alimente, eles poderão arrefecer.

Um desses ingredientes fundamentais adicionais é o diálogo. Para se manter um diálogo, em todas as situações, é preciso muita tolerância, dando por exemplo espaço para o outro expressar suas ideias, sentimentos e vontades, estando muito atento a eles. Mais ainda, é preciso incentivar permanentemente o outro a manifestar tudo isso.
 
A tolerância é um sacrifício?
Sim. Para ser tolerante, é preciso: sacrificar o impulso de se impor sobre o outro e de tentar torná-lo igual ou semelhante a si próprio; ceder uma parte do espaço pessoal para que o outro possa exercer suas habilidades; silenciar interiormente e ouvir o outro sem prejulgá-lo; fazer um esforço e interessar-se pelo outro, como já vimos, satisfazendo suas necessidades e permitindo que exerça suas habilidades; prestar atenção e notar se está havendo interação com o outro. Além disso, é preciso muita paciência para permitir que o outro tenha ideias e faça ações contrárias às que gostaria de ver realizadas. A esse respeito, é interessante notar que ‘tolerância’ vem do latim tolerantia, que significa, além da tolerância, constância em suportar, paciência, resignação, socorro. Todos esses significados claramente envolvem um sacrifício pessoal.

Em outras palavras, a tolerância exige a sublimação do egoísmo existente dentro de cada um de nós e o desenvolvimento de um verdadeiro amor altruísta. Infelizmente, esse tipo de amor não faz sentido para um materialista, pois pressupõe a liberdade. Da matéria, só pode advir egoísmo.
Se uma pessoa autoeducou-se a ponto de a tolerância fazer parte de seu temperamento, de seu ser, então seu exercício passa a ser natural da pessoa e deixa de ser um sacrifício. Enquanto a tolerância deve ser imposta a si mesmo, há ainda um longo caminho a ser trilhado para o aperfeiçoamento pessoal.